sexta-feira, 22 de março de 2013

O Pai de Ontem e o Pai de Hoje...Quais as diferenças?






                   







Parece que aquele pai arcaico e guerreiro, à semelhança do Deus judaico, senhor dos exércitos e das famílias, cedeu o seu trono em troca de uma relação de cumplicidade com os filhos, para desempenhar funções jamais imaginadas em eras passadas. O pai de hoje já não consegue ser mais aquele que toma posse do filho para reger o seu destino.

Um exemplo de como eram as relações entre filhos e pais antiquados estão presentes na “Carta ao Pai”, que o escritor checo, Kafka (1883 – 1924), redigiu e nunca teve coragem de enviar ao seu destinatário. Na carta do autor de “Metamorfose”, que só veio a público após a morte de seu pai, encontramos essa emblemática declaração:

“Da tua poltrona, tu regias o mundo.

Tua opinião era a certa,

qualquer outra era disparatada,

extravagante, anormal”.

Hoje, as descrições da antropologia definem o pai da pós-modernidade como o “Pai Mutilado” que, ao permitir uma moderna desordem no seio da família, abalou os velhos costumes centrados no poder coercitivo patriarcal.

Esse pai pós-moderno, já não vê o filho como um objeto inteiramente submisso à sua vontade. Por outro lado, o filho moderno também deixou de ser uma coisa para se tornar um sujeito integral.

O facto é que o que antigamente era totalmente imprevisível, hoje, tornou-se muito comum: pai e filhos, no fim-de-semana, passam horas na cozinha da casa, a conversar  após o almoço, trocam impressões de forma divertida sobre assuntos diversos do quotidiano familiar. Foi-se o temor do filho ser repreendido por discordar do pai. Aliás, não são poucos os filhos, que hoje, têm sido verdadeiros conselheiros dos pais, antes deles tomarem qualquer decisão importante. A seriedade da família antiga que, exigia uma postura sacra na hora solene das refeições, deu lugar aos incontroláveis momentos de humor, onde a descontração é o que conta, ou seja, um pai espontâneo, rindo dele mesmo, das histórias engraçadas contadas pelos filhos sobre as hilariantes peripécias do seu dia a dia.

A relação “Senhor-Servo” (patriarcal) deu lugar a um vínculo premiado de intensa cumplicidade, onde o pai é mais amigo do filho do que mentor, em que pese a sua condição de provedor. Os laços afetivos são tão estreitos, com visões de mundo tão alinhadas que os próprios pais chegam a aceitar de bom grado que os filhos posterguem ao máximo a sua saída definitiva da casa paterna.

Pais a ser contestados, desafiados e a receber conselhos dos filhos?! Quem, no tempo dos nossos avós, poderia pensar que isso fosse um dia acontecer?!

Não se sabe bem como será a família do futuro após o desmoronamento dos muros rígidos que separavam o terreno da autoridade paterna do que era a área do filho.

Quem diria que o pai-patrão, um dia, viria a ser um exímio trocador de fraldas, facto que por si só, é um indicativo de que os tempos são outros, tempos de servir aos filhos sem pensar em interesses pecuniários, como era comum no passado dos pais que diziam com fervor: “Estou a investir nos filhos, para no futuro ser bem recompensado por eles”.

O terrível julgamento que proibia os filhos de superarem os pais, presente na evocação da famosa frase do poeta e filósofo romano, Horácio − “Valemos menos que nossos pais, e nossos filhos valerão menos que nós” − hoje, isto já não tem razão de ser.

Parece mesmo que estamos a viver uma nova ordem a que os conservadores chamam de “desordem familiar”, onde o pai, à semelhança do Deus Patriarcal Judaico cansado de guerras, decidiu, de uma vez por todas, desnudar-se de todo o poder para se reinvestir da horizontalidade do amor fraternal, em que todos do lar comungam de um mesmo sentimento.

 


 

Sem comentários:

Enviar um comentário